giovedì, marzo 17, 2005

Descomemoração

Hoje minha sobrinha Isabella completaria 6 anos de idade, se estivesse viva. Pus uma foto dela na geladeira. Olhei pro céu e não disse nada, nem pensei em nada, como se procurasse, sem sucesso, enxergar o invisível.

domenica, marzo 13, 2005

Saúde Pública

Fugindo um pouco do assunto chave desse blog, que é a música e suas derivações, queria contar um pouco da minha experiência de ir tomar soro num hospital público. Resumindo meu histórico de saúde, a cada 5 ou seis meses tenho alguma crise gastro-intestinal que me atormenta há alguns anos. Essa fragilidade se deve em parte à minha genética e em outra parte às influências puramente emocionais que se descarregam nessa parte do meu corpo.

Mas o que vem ao caso é que, apesar de ter plano de saúde e sempre ter procurado pronto-socorro particular pra ser atendido, não me lembrava onde havia hospitais próximos à minha nova casa. Só me lembrava de um, que ficava na rua Castro Alves, o Hospital Municipal do Servidor Público.

Chegando lá me dei conta disso e perguntei sobre a demora pra ser atendido. Não tinha muita gente, eram 4 da manhã. "Um pouquinho" o rapaz da recepção me respondeu. Preenchi a ficha. Meia hora depois fui atendido por uma médica, cujo sotaque goianense me acalmou. Eu não conhecia o sotaque de Goiânia, até perguntar de onde ela era.

Dá pra ver que um hospital como esse não pode ter como prioridade o acabamento de pintura nas paredes, a conservação de materiais oxidáveis e nem a substituição completa de lençóis manchados de sangue (mas com certeza lavados). Eles devem se ater ao mínimo de pessoal para atendimento, medicamentos como o soro e o plasil que eu tomei e pagamento de contas de luz e água pra continuar funcionando na madrugada.

Ontem fui à uma festa e, saindo dela, nos deparamos eu e a Silvia com um menino caído no chão chorando, com sangue seco nas mãos e a camiseta manchada com algumas gotas, talvez de sangue também. Isso perto do ponto final de ônibus da 9 de Julho, moleque de rua, podia até ser um golpe, mas não ligamos muito pra essa hipótese. Pensei: vamos levá-lo pro mesmo hospital onde tomei o soro pra ver se não tem nada grave.

Sábado à noite, hospital cheio de gente no corredor tomando soro, alguns tomando glicose, alguns ataques e reações ao álcool e outras drogas. Faço cafuné no menino e descubro que, apesar da aparência infantil, ele têm 11 anos e mora desde os 6 na rua. "Se bobear, ele passa a perna em mim e em você juntos ao mesmo tempo", me disse a médica (não aquela de goiânia que me atendeu na terça feira). "Talvez esse sangue não seja nem dele", disse ao limpar o possível ferimento. Dei uma camiseta minha pra ele, que lavou também as mãos, apesar de estar inteiro encardido.

Ao sair, levaria ele de volta pro centro da cidade e, antes de entrar no carro, dei a ele 3 reais, pra ele comer alguma coisa. Quase 5 da manhã, passa uma senhora carregando 4 sacolas e vê a cena, esbravejando: "eu conheço esse moleque. Se quer que ele coma compra você mesmo a comida porque senão ele vai gastar tudo em cola." Aí me dei conta, mas também já tinha dado o dinheiro. Paramos num posto, eu e a Sil. Ela comprou um pacote de bolachas e um suco de canudinho. Fiquei nesse percurso falando pra ele tentar procurar as pessoas boas, que não se metiam com drogas, que não cheiravam cola. Ele disse que um saquinho de cola custa 1 real. Não sei enxergar o tamanho do crime que é vender cola pra uma criança.

Deixamos o menino perto do Teatro Municipal, que ironia, lá ele já conhecia o terreno. Deve conhecer bem melhor que eu... está lá há mais de 5 anos. Acho que ele só queria mesmo um pouco de atenção. E mesmo que ele compre 3 saquinhos de cola com o dinheiro que eu dei pra ele, fico feliz dele ter passado por essa experiência conosco. Uma pena que tudo provavelmente continuará como está e existe uma grande chence dele se tornar mais um personagem daquele documentário "Onibus 174".